O BREGA-FUNK COMO IMPULSO PARA O SUCESSO
Apesar de ter 21 anos de idade, Anny Miranda do Amaral é considerada uma das bailarinas mais antigas do brega-funk recifense. Nascida no Bairro de Areias, na Zona Oesta do Recife, a bailarina é órfã de pai, que morreu quando ela tinha 11 anos. Hoje, mora com a mãe e uma prima pequena. Concluiu o Ensino Fundamental no Educandário Professora Eusa Carpintero (EPEC), estudou uma parte do Ensino Médio no Colégio Heróis da Restauração e outra no Colégio Mariano Teixeira. Começou a dançar profissionalmente enquanto ainda cursava o primeiro ano e, atualmente, trabalha na banda do MC Tocha, em lojas parceiras e no Instagram como Digital Influencer.
Quando foi que a dança passou a fazer parte da sua vida?
Desde criança sempre fui envolvida em coisas de dança. Já passei por vários grupos de dança, várias coisas. Quando eu recebi a proposta para dançar, na época, era a dupla Tocha e Dadá Boladão, conversei com a minha mãe e ela super me apoiou, porque ela sabia que era uma coisa que eu sempre amei. Claro, ela deixou claro que eu tinha que continuar estudando.
Quando foi que você entrou na banda?
Acho que há uns 6 anos atrás, quase 7. Iniciei com Tocha e Dadá Boladão. Passei uns quatro anos dançando com eles. Saí da banda e passei uns sete meses dançando com o MC Sheldon. Depois disso, parei de dançar. Foi quando passei oito meses sem dançar porque comecei um relacionamento. Quando eu retornei, a dupla tinha se separado, então, voltei a dançar com Tocha, até hoje.
Sua família te apoiou e te apoia como dançarina?
Sempre. Minha família sempre me apoiou. Minha irmã ama, ela faz questão de dizer a todo mundo que a irmã dela é dançarina. Todo mundo acha legal, ninguém tem preconceito, porque, querendo ou não a gente sofre um pouco principalmente mulher. Já sofremos preconceito só pelo fato de ser mulher e sendo dançarina, então... Mas, graças a Deus, na minha família e com meus amigos nunca sofri preconceito em relação a isso, pelo contrário.
Seu pai sabia do teu amor pela dança?
Ele via que eu sempre fui envolvida em grupos de dança, desde muito pequena. Ele sempre achou bonito.
Como você conciliava os estudos com a dança?
Era complicado, porque o meu colégio na época era integral em alguns dias da semana. Era cansativo para mim, principalmente nas sextas ou segundas-feiras que eu passava o dia na escola. A noite, no caso, na madrugada, eu fazia shows. Eu ficava bastante cansada, mas eu estava muito empolgada com início, não queria nem saber. Conseguia aguentar porque eu queria muito.
Você já havia trabalhado antes de se tornar dançarina?
O meu primeiro emprego foi a dança. Foi nela que eu comecei a não mais depender da minha mãe. No caso, não era a minha mãe, porque ela não trabalhava na época, cuidava de mim. Antes, minha irmã morava na minha casa, ela era de maior, era quem trabalhava e ajudava a gente. Depois que eu comecei a dançar, o custo para a minha diminuiu, porque eu me sustentava e também ajudava em casa. Tudo graças a banda.
Como percebeu que podia fazer da dança um meio de ganhar dinheiro?
Quando eu comecei a dançar com Tocha e Dadá, no início, eu não recebia tanto, porque a dupla também estava começando. Mas, no momento em que eles “estouraram”, foi o momento de dizer: “consigo viver disso aqui”. A gente fazia muitos shows, então, eles começaram a pagar bem. Assim, não para viver 100% disso, mas já ajudava bastante.
Além da dança, você trabalha com outras coisas?
Eu tenho parcerias com muitas lojas, muitas lojas mesmo. De roupa, de sapato, de maquiagem, de comida etc. Tem lojas que me procuram para fazer fotos com as coleções, então, levo em conta a quantidade de fotos e looks que a loja quer mostrar. Analiso e dou o meu valor. Tem outras lojas que me procuram para me presentear com os produtos da loja para eu fazer apenas a divulgação no meu Instagram. Não cobro por isso, porque, de certa forma, já estou sendo presenteada, seja ganhando uma peça de roupa, uma bolsa ou um sapato. No Instagram também tenho o meu trabalho como Digital Influencer. É lá que eu divulgo o meu trabalho e dou dicas.
Como dançarina, você tem alguma referência? Algum ídolo em quem você se inspira?
Eu admiro muito as meninas do brega pernambucano. Mas, tem um grupo perto da minha casa que se chama DK. É um grupo de swingueira que é composto predominantemente por gays e algumas meninas. Quando rola ensaios, sempre que dá, eu vou assistir porque eu me sinto inspirada quando chego lá. Eles dançam muito! Só vendo para ter a noção de como é. Então, tipo assim, eu gosto muito de ir lá nos ensaios deles porque, só de olhar, acho que aprendo um pouco e saio mais motivada e inspirada de lá. Mas, como artista, Beyoncé, né?! Quem não se inspira naquela mulher? Eu coloco os vídeos dela e fico babando. Ela é demais!
Em que momento da carreira você começou a ganhar popularidade e reconhecimento das pessoas?
Na época de Tocha e Dadá, porque eu comecei a ser vista. Ganhei um fã clube. Quando eu vi as meninas marcando comigo para me encontrar na Praça 13 de maio, várias meninas. Foi o momento que percebi que estava começando a ser conhecida. Isso foi há muito tempo atrás, quando a internet nem era essas coisas toda que é hoje. Instagram nem existia.
E nas redes sociais, como é que tu lida com a popularidade?
Eu gosto, mas nem sempre é bom. Rede social é bom porque aproxima as pessoas que gostam de mim e, de fato, tem pessoas que realmente gostam de mim, que quer ver a minha vida porque gosta. Só que também tem pessoas que não gosta de mim. Também sou seguida por pessoas que estão ali para falar mal da minha vida, como muitas outras meninas que dançam, também passam por isso. Não é tanto o meu caso, mas, às vezes, sai um comentariozinho não tão legal. Então, eu sempre tento colocar a minha cabeça no lugar em relação a isso. Vejo as rede sociais como uma forma de aparecer para as pessoas que gostam de mim, mas é mais como uma forma de trabalho mesmo.
Ao entrar na dança, você esperava todo esse reconhecimento do público?
Não, quando eu comecei no brega, não achei que ficaria tanto tempo, pensei que seria uma coisa passageira, mas fui ficando conhecida. A primeira vez que fui a um encontro de fã clube, vi o tanto de meninas e fiquei assustada. Elas já fizeram aniversário para mim, já organizaram festinhas. Inclusive, é nessas coisas que eu penso em dias difíceis. Elas me motivam.
Poderia revelar quanto você ganha como bailarina?
Eu não sei se eu posso revelar, porque não é uma coisa só minha, tem a ver com a galera da banda, com os meus patrões. Eu não sei se eles iam achar confortável dizer o quanto me pagam. Mas eu não recebo por show, sou assalariada. Tem bandas que fecham o contrato por show, por exemplo, se a menina dançar três shows na noite, ela recebe o valor daqueles três shows. Mas, tem outras bandas que preferem fechar um contrato com um salário de valor fixo no final do mês. Na banda de Tocha é assim, a gente recebe 15 e 30. Bem certinho.
O que tu faria se tu não desse certo como dançarina?
O meu sonho desde criança era ser dançarina, mas, à medida que fui crescendo comecei a pensar em alguma coisa para fazer e gostava muito de arquitetura. Gosto muito desse negócio de decoração. Seria um lado que, talvez, eu poderia estudar. É com o que me identifico.
O brega é um ritmo bem corporal, com danças sensuais. Então, nos palcos, você já se sentiu objetificada por ser bailarina mulher?
Eu acho que todas as meninas que dançam já devem ter passado por algum tipo de situação desagradável. No caso, nunca fui ao extremo, não. Ninguém nunca chegou a me tocar ou pegar em alguma parte de mim, mas, já aconteceu com algumas meninas que conheço. A consegue ver a maldade no olhar de alguns homens. Uma vez, um cara me chamou, eu fui até ele, já sem querer ir, então, ele olhou para mim e disse “você é uma gostosa”. Revidei e disse: “é, eu sou gostosa e você é um nojento”. Ele ficou sem reação. Acho que ele não esperava que minha reação fosse aquela. Talvez tenha pensado que eu ia sorrir e achar legal.
Nas redes sociais, você já sofreu algum tipo de assédio?
Olha, nem tanto. Assim, eu recebo mensagens de alguns homens nas redes sociais, mas é só elogiando mesmo. Não é nada me ofendendo, não. Até porque o público do meu Instagram é, em maioria, feminino.
Como dançarina, você se sente empoderada?
Eu tenho bastante confiança no meu trabalho. Eu sei que, quando subo no palco, consigo representar bem, porque, quando estou dançando, eu só vivo aquele momento. Posso está com dor de cabeça, no dedo, onde for ou até com meus problemas pessoais, eu subo no palco e consigo esquecer completamente de tudo. Então, eu me sinto confiante quando estou dançando, mas sempre com humildade.
Como você lida com comentários positivos e negativos em relação a tua dança?
Para ser bem sincera, acho que toda crítica é construtiva para as pessoas. Não lembro de alguém ter chegado para mim e falar alguma coisa assim. Mas, se for olhar o Youtube, vídeos meus dançando, tem alguns comentários do tipo: “não sabe dançar”, mas são coisas muito fúteis. É a opinião da pessoa e pronto, mas, assim, eu respeito.
Você já pensou em parar de dançar por causas das críticas?
Não. Só penso em parar de dançar quando eu engravidar. Assim que descobrir que estou grávida, vai ser o momento de parar. Não sei se vai ser para sempre, porque dizem que quando a pessoa se torna mãe a forma de pensar muda.
Já realizou sonhos na dança?
Eu já vivi muitos momentos bons como dançarina. Já gravei DVD. No meu início, o que eu achava lindo era fazer os videoclipes. Fiz todos os clipes possíveis, mas, eu tinha uma grande vontade de gravar um DVD. A experiência de participar é maravilhosa, só sabe quem já dançou. Muito tempo de ensaio, muita preparação. Então, a gente fica naquela ansiedade para a estréia. Eu já fiz dois: gravei um com Tocha e Dadá e outro mais recente com Tocha.
Quem cria as coreografias das músicas do MC Tocha?
Atualmente, Warley Santos, o dono da Cia DK, que contei. Na época de Dadá, meu coreógrafo era Deivson Lima.
Como funciona a tua rotina?
Tem semana que é bem tranquila, fico só em casa mesmo. As pessoas dizem que eu sou louca porque gosto de ficar no meu quarto, com minhas coisas, minhas músicas, assistindo. Tem dias que eu fecho loja durante a semana, geralmente é a tarde. Fechar a loja é ir na loja, tirar fotos. Quando volto para casa, a noite, continuo fazendo a divulgação no Instagram. Todos os finais de semana eu tenho show.
O que tu faz nas horas vagas?
Gosto de ficar em casa, mas, se for para sair, prefiro ir à praia. Amo estar na praia, mas não pela manhã, a tardezinha. Gosto de ir a shoppings. Não sou muito de ir a shows, baladas. Lugares agitados assim, que já costumo frequentar trabalhando, eu não gosto de ir. Já curti muito, mas, hoje em dia, prefiro lugares tranquilos, um barzinho, sair para comer ou ir ao cinema.
Como você cuida do corpo?
Eu não treino, não malho, não faço dieta, como tudo o que eu tenho vontade. O único exercício físico que faço é nos finais de semana quando vou fazer shows. Até ensaio a gente não tem com frequência. Só quando Tocha lança música nova e quer coreografia.
Se sentiria oprimida caso não tivesse o corpo que tem hoje?
Acho que não! Não sou muito paranóica em relação ao meu corpo. Já fui quando era bem novinha, quando mais nova, por sempre ter sido muito magrinha. Eu estava iniciando no meio do brega e, naquela época, a maioria das dançarinas eram só mulheres de muita bunda e muita perna. Eu tinha vontade de ter um corpo desses, mas, hoje em dia, já sou bem tranquila em relação a isso. Gosto de ser magra. Amo porque não preciso fazer academia, não preciso fazer dieta, então, está perfeito.
Existe cobrança em relação a estética na banda?
Não, nenhuma. Eu nunca vi Tocha, nem ninguém da banda, falar que a gente tem que malhar, tem que se maquiar. Eles nunca falam sobre isso. As cobranças que eles tendem a fazer é em relação a dança. Quando eles querem que a gente vá ensaiar e, às vezes, “pagamos de doida”, eles cobram “cadê o ensaio?” Apenas.
Como é a tua relação com o teu namorado?
É tranquilo. Vamos fazer 2 anos em janeiro de 2019. Às vezes, ele tem alguns ciúmes. Normal, se não tivesse eu acharia que ele não gosta de mim. Ele já trabalhou com banda, então, entende um pouco como é. Nas redes sociais, rola ciúme também em relação as fotos de biquíni, então, eu só posto quando é realmente necessário, por exemplo, quando alguma loja me manda a peça para divulgar.
Você tem projetos futuros com a banda ou tem outros planos?
Eu acho que não vou dançar por muito. Daqui a uns anos, quando eu tiver com uns 25 anos, eu já quero ser mãe. Então, vou me programar para isso, se for a vontade de Deus. Eu quero viver esses últimos anos na dança intensamente, porque a minha intenção é parar e construir uma família.
Qual é o teu maior sonho?
Meu maior sonho é ter uma estrutura financeira melhor para ajudar a minha mãe, a minha família. Ter o meu próprio negócio, que eu ainda não sei exatamente o que será. Estou no processo de procurar o que realmente vai me fazer feliz, porque não consigo só trabalhar pelo dinheiro, tenho que realmente gostar do que faço. Depois disso, construir minha própria família.
O que o brega significa para você?
É cultura. O que seria da gente sem o brega? É a raíz daqui, é como o funk no Rio de Janeiro. O brega é cultura, é o que me sustenta e é o que eu gosto.
O que você pensa a respeito do preconceito contra o brega?
Eu acho que a gente já quebrou uma barreira muito grande. Realmente, antes, era bem maior, mas, hoje em dia, a gente vê muito “filhinho de papai” no brega, curtindo. Então, o preconceito a gente está quebrando e vai conseguir cada vez mais.